No ano de 1960, eu estudava na Faculdade Nacional de Direito no Rio de Janeiro, onde lecionava direito penal o professor Oscar Stevenson, que tinha como assistente da cátedra, um renomado advogado de nome Leopoldo Heitor, popularmente conhecido como o Advogado do Diabo. Esse advogado dava aulas práticas de direito penal, aos sábados, oportunidade em que ensinava aos alunos todos os macetes de um criminalista, na defesa de seus clientes, mesmo que, em determinados casos, arranhasse os limites da ética profissional. Falava das muitas artimanhas que o causídico podia adotar, no decurso do processo, para confundir a outra parte ou até mesmo o magistrado, sempre com o objetivo maior de livrar o cliente da condenação. Numa aula que assisti, lembro-me de um exemplo que ele deu: em determinadas circunstâncias, o advogado podia juntar ao processo algo completamente disparatado, como um artigo de jornal, sem nenhum vínculo com a causa, para deixar o advogado da outra parte baratinado, perdendo boa parte de seu tempo para tentar descobrir a razão daquela inclusão.
Leopoldo Heitor ficara famoso face à sua atuação no chamado crime do Sacopã, que teve grande repercussão na imprensa de todo o país. Ele era um sujeito bem falante e ganhara a confiança do professor Oscar Stevenson que o convidou para seu assistente na cátedra de direito penal na Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil. Segundo relatos de alunos da faculdade, Leopoldo Heitor passou a frequentar a casa do catedrático, com quem rapidamente se desentendeu. Segundo boatos no meio acadêmico, Leopoldo Heitor teria tentado seduzir ou teria mesmo seduzido uma jovem bem próxima do professor, o que, naturalmente, não posso confirmar. O fato é que Oscar Stevenson foi o primeiro a denunciar Leopoldo Heitor pelo sumiço da milionária Dana de Teffé.
Segundo o jornalista e escritor Carlos Heitor Cony, Dana de Teffé era de origem judaica, com cidadania tcheca, passando por vários países antes de chegar ao Brasil. Além de bailarina clássica, ela teria sido espiã de alemães, russos, ingleses e mexicanos. Aqui, casou-se com o embaixador brasileiro Manuel de Teffé von Hoonholtz, tornando-se uma mulher muito rica. E 1951, mudou-se com o marido para o Rio de Janeiro. Após separar-se do embaixador, ela contratou o advogado Leopoldo Heitor de Andrade Mendes para administrar sua fortuna. Foi nesse momento que ela entregou o ouro ao bandido, pois, munido de uma falsa procuração, Leopoldo Heitor conseguiu botar a mão na fortuna de sua cliente. Advogado e cliente teriam também mantido uma relação amorosa, pois Leopoldo Heitor era famoso também pelas suas conquistas no mundo feminino.
Durante
uma viagem pela Via Dutra, em companhia de Leopoldo Heitor, Dana de Teffé
desapareceu, misteriosamente. O advogado foi preso, julgado e condenado por
assassinato. Ele alegava que ambos tinham sido assaltados e que Dana fora
sequestrada. Conseguiu fugir da prisão, e somente anos mais tarde foi recapturado.
A condenação do primeiro julgamento foi anulada e, num segundo julgamento, ele
obteve absolvição. O motivo parece ter sido a falta do corpo. Ele levava muito
a serio aquele princípio jurídico: “sem cadáver, não existe crime”.
O fato é que o corpo de Dana nunca foi encontrado.
Ele
conseguiu que seu julgamento fosse feito na cidade de Rio Claro, onde tinha um sítio e também onde desfrutava de
grande popularidade. Ele fez sua defesa e conseguiu a absolvição.
Depois
de solto, o Advogado do Diabo voltou à sua banca de advocacia, no Rio de
Janeiro, exercendo a profissão até sua morte em 2001. Casou-se por três vezes e
teve dez filhos. Sua imaginação fértil continuava insistindo no sequestro de
Dana de Teffé e dizia por aí que, com outro nome, ela estaria vivendo num país
da cortina de ferro e que um dia, reapareceria.