
A cena narrada a seguir, se passa na localidade de Cerro Negro, um povoado localizado no planalto catarinense e foi extraída do livro Menino Tropeiro de R. H. Souza. Estávamos no início dos anos trinta e minha família morava nessa localidade, onde meu pai era professor primário. O povo da região mantinha tradições curiosas, entre as quais se destacava aquela da encomendação das almas, uma cerimônia realizada nas sextas-feiras da quaresma. A seguir, a narrativa.
"Entre a gente nativa da região existia também um costume singular. Numa noite, dormíamos tranquilamente em nossa casa, quando fomos acordados por orações e cânticos, acompanhados do ruído de matracas à porta da escola. Minha mãe acordou assustada e perguntou a meu pai o que aquilo significava e ele respondeu:
– Fiquem todos quietos, porque se trata de uma cerimônia de encomendação
das almas.
– Mas o que isso significa?
– Em noites da quaresma, o povo se reúne no
cemitério e dali partem grupos de homens, mulheres e crianças. Visitam as casas. cantam e rezam pelas almas. As pessoas da casa devem ficar em silêncio e só
abrir as portas depois de terminada a cerimônia. Aí, sim, podem receber os visitantes
e lhes oferecer um café ou coisa parecida.
E assim, aconteceu lá em casa. Dona Lina
correu para a cozinha, fez um café, cortou fatias de pão e levou tudo até a
escola, onde os visitantes noturnos aguardavam em silêncio. Depois
que terminaram de comer, se retiraram e foram atrás de outras residências do
povoado, repetindo o mesmo cerimonial de cânticos e orações pelas almas
sofredoras. Confesso que aquela cerimônia noturna tinha qualquer coisa de
misterioso e impressionava as pessoas visitadas."
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