A preocupação hoje com relação às trapaças é muito grande em nosso país. São os produtos vendidos através de publicidade enganosa, são as bandalheiras na internet, a violação de contas bancárias e muitos outros truques desenvolvidos pelos espertalhões. Precisamos ficar vinte e quatro horas atentos para não sermos enganados. Mas as práticas desonestas com relação aos consumidores não é coisa de nossos dias. Elas sempre existiram. Vou relatar um fato estarrecedor ocorrido em minha infância, que bem demonstra essa afirmação. O texto foi extraído de meu livro Menino Tropeiro. Leia, a seguir:
"Voltando a falar da criação de suínos, um fato me foi narrado nessa época, deixando-me estarrecido, apesar da minha pouca idade. Durante uns feriados, fomos convidados a visitar um fazendeiro rico, cuja propriedade ficava perto do povoado. Ele mandou um empregado com uma carreta, para buscar nossa família. A fazenda era muito bem cuidada, com muitas plantações. A casa principal era grande, pois se tratava de uma família numerosa. O proprietário não se encontrava, pois precisou viajar para tratar dos negócios de suínos, mas sua mulher nos recebeu com muitas atenções. Eles tinham numerosos filhos e um deles, um menino mais ou menos da minha idade, me acompanhava durante todo o tempo. Ele falava pelos cotovelos e um dia me contou que, um ano antes, a criação de porcos da fazenda fora atingida pela peste. Morreram muitos animais - disse-me ele.
– O prejuízo era muito grande – prosseguiu o menino, cujo nome era João –, mas meu pai teve uma grande ideia ...
– Que ideia foi essa?
– Ora, pegamos a banha dos porcos pesteados e a colocamos nas latas até a metade e, depois, completamos com banha boa.
– Por que até a metade?
– Ora, porque a banha do porco pesteado é amarelada e a do porco bom é branca. Assim, a banha ruim ficava escondida e o comprador só iria perceber quando tirasse a banha boa da parte de cima. E isso iria demorar, porque as latas eram grandes.
– Sim, mas aí seria fácil saber quem lhe vendeu essa banha estragada.
– Meu pai disse ser muito difícil, pois as latas eram todas iguais e, ao chegarem ao frigorífico, ficavam nos depósitos, misturadas a outras latas e, só depois de um tempo, vendidas para os comerciantes. As vendas ao povo seriam feitas em pequenas quantidades, demorando um bom tempo para esses comerciantes darem de cara com a banha amarelada. Então, não adiantava mais chorar, porque a merda já estava completa.
Acabei de ouvir a sinistra história e nada falei. João pediu para eu não contar nada pra ninguém, pois iria complicar a vida de seu pai. Fiquei muito assustado com o fato e lá em casa, sempre que minha mãe comprava banha de porco eu ia verificar sua cor. Graças a Deus, era sempre branca, porque, se fosse amarela, era preciso contar a história para ela.
Uns tempos depois, viemos a saber que João, um dia, saíra a cavalo pelas matas da fazenda atrás de um novilho e se perdeu. Foi necessário reunir diversos cavaleiros da região para procurá-lo e só o encontraram três dias depois, quase morto, deitado ao pé de uma árvore, tiritando por causa do frio intenso."
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