quarta-feira, 9 de outubro de 2013

EM MEMÓRIA DE MINHA IRMÃ, MARIA APARECIDA SOUZA TRIPODI (1942-2013)


                                       NOSSA SENHORA APARECIDA, PADROEIRA E RAINHA DO BRASIL



( Texto extraído do livro Menino Tropeiro, de R.H. Souza)

"E aconteceu novamente o inevitável. Minha mãe ficou grávida de mais um filho. Era o de número cinco, excluindo aquele que ela perdera dois anos antes. Desta vez, a gravidez era em condições  difíceis,  pois  ela  ficava a  maior parte do dia sozinha em casa com os dois filhos pequenos, enquanto minha irmã e eu íamos para a escola com meu pai. João, o empregado, fora embora,  porque  também  precisava ajudar sua família nos trabalhos da lavoura. Se ela tivesse um problema repentino, quem iria socorrê-la? Nos dias em que não estava bem, eu faltava a aula para ficar em casa de plantão. Meu pai passou a considerar que a mudança para o sítio tinha trazido mais males do que benefícios. Agora, sem a ajuda de João, não tinha mais ninguém para trabalhar na lavoura e o mato tomava conta das plantações.
No dia 7 de maio de 1942, minha mãe teve uma menina, a quem deu o nome de Maria Aparecida, em homenagem à padroeira do Brasil, de quem era muito devota. Quem realizou o parto foi uma senhora que morava num sítio a dois quilômetros do local. Nesse dia, eu fiquei de plantão, com um cavalo preparado para chamar a parteira. Quando minha mãe sentiu as primeiras dores, parti a galope atrás da boa senhora e, duas horas depois, ela já estava a postos, momento em que meu pai também chegava da escola. Graças a Deus, tudo correu bem.
Mas, depois do parto, dona Lina não era mais a mesma pessoa. Tinha problemas intestinais, passava por crises graves de saúde. Uma noite, ela estava tão mal que meu pai me chamou e perguntou se eu tinha coragem de ir até Anita Garibaldi e chamar o dr. De Negri.
 Eu disse que sim e me pus logo a caminho. Estava muito escuro e caía uma chuva fininha que penetrava os ossos, além do frio, pois era o mês de julho, em pleno inverno. Pelo caminho eu pensava se o médico iria atender ao chamado, depois daquela confusão na casa de Silvério entre minha mãe e d. Talita. As famílias não se falavam há muito tempo.
Ao chegar em Anita Garibaldi, fui até a casa do médico, mas ele não estava. D. Talita, sua mulher, me atendeu  bem,  mas  informou  que  ele tinha ido visitar um doente e ainda não retornara, mas era esperado em casa naquela noite. Fiquei desesperado e voltei para casa onde o estado de saúde de minha mãe se agravara.
Depois de algum tempo de hesitação, meu pai resolveu retornar comigo à casa do doutor e, quando lá chegamos, graças a Deus ele ali se encontrava. Imediatamente, pegou sua maleta e nos acompanhou pelos caminhos tortuosos que iam dar em nossa casa. Numa descida, cujo chão estava escorregadio, ele tropeçou num pequeno arbusto e caíu. Embora, todo arranhado, disse que não tinha acontecido nada e avançamos rapidamente. Ao chegarmos em casa, encontramos minha mãe ainda com muitas dores na barriga. O médico a examinou e depois lhe deu uma injeção que a fez dormir por um longo período. Já era dia claro e dr. Giovanni continuava de plantão, pois estava preocupado com o estado da paciente. Reunido com meu pai na pequena sala, ele falou:
– Professor, o estado de saúde de sua mulher é muito preocupante.  É melhor todos voltarem a residir no povoado, pois aqui nesses matos podemos fazer muito pouco  por ela.
– Eu já tinha pensado nisso – disse meu pai. – Mas a Lina é teimosa e não quer abandonar suas plantações.
– É melhor ficar sem as plantações do que sem a vida. Aqui, fica difícil lhe dar assistência médica. O sr. tem o exemplo de hoje.
– Vou falar com o Silvério, pois o casarão onde morávamos lá na vila, continua vazio. Vou lhe pedir permissão para voltarmos, imediamente, para lá.
– Faça isso, professor. É para o bem de toda a família, pode acreditar.
Apesar do problema com a vaca, Silvério não  fez nenhuma objeção e algumas semanas depois, a família voltava ao ninho antigo. Era a quarta mudança que fazíamos no pequeno povoado naquele esquema de vida de ciganos. Deixamos para trás a casa do sítio que era fria e úmida e voltamos para o casarão bem confortável, com todos os cômodos com forro de madeira e as paredes calafetadas com ripas pregadas sobre a junção das tábuas para impedir a entrada do vento e do frio. A grande vantagem, agora, é que estávamos a duzentos metros da escola e dona Lina contava com a assistência de todos a qualquer hora.
E a família tomou também uma decisão importante: vaca emprestada, nunca mais. E eu, depois de um tempo, voltei a tocar o Angelus, três vezes ao dia, pois na minha ausência ninguém se candidatara para a realização da sagrada tarefa.
A rotina voltou a tomar conta do povoado. A única saudade que eu tinha do sítio, era a abundância de lenha. Bastava sair da casa que, por todos os lados havia galhos secos em profusão. Bastava arrastá-los para o pátio e botar o machado pra funcionar. No sítio também havia muita fartura de pinhão, mas tínhamos muitas vezes que disputá-los com os porcos que os criadores soltavam no mato, na época de produção do fruto, mais precisamente no inverno. Durante esse período, o vento debulhava as pinhas e os suínos, espertos, dormiam debaixo dos pinheiros e quando o dia clareava, o alimento estava ao alcance de seus dentes. Quem chegasse mais tarde, ficava a ver navio".

                                        

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