sexta-feira, 7 de novembro de 2014

O MÚSICO QUE TRABALHOU DURANTE TRÊS LONGOS DIAS E NÃO RECEBEU O DEVIDO PAGAMENTO. QUAL FOI A SUA VINGANÇA?


Acordeon Sanfona Veneza 80 Baixos Fenix Vz2006 Com Hard Case

Um acordeão  de 80 baixos, como o da foto, funciona como uma verdadeira orquestra. Era uma desses que  Fabrício tocava com muita maestria e que o tornara famoso ao longo da fronteira do Rio Grande do Sul/ Santa Catarina.

 Na minha infância, final da década de trinta, minha família morava num povoado situado no interior de Santa Catarina, de nome Anita Garibaldi, onde meu pai exercia a profissão de professor primário. Em meu livro, Menino Tropeiro, narro alguns episódios curiosos que aconteceram naquela localidade. Aqui, destaco um deles, com o título: A Vingança do Sanfoneiro Fabrício, que publico,  a seguir:


"No dia 4 de dezembro se comemorava a festa da padroeira do lugar, Santa Bárbara. Os líderes locais se reuniram para escolher o festeiro, que era o responsável pela organização da efeméride. Naquele ano de 1940, dr. Giovanni e a mulher foram os escolhidos e o casal se propôs fazer uma festa inesquecível. Nossa família foi convocada para colaborar. Meu pai ficou encarregado do bar do salão de festas e minha mãe do restaurante, a ser instalado num grande barracão numa área próxima. As novidades agradaram aos moradores do lugar.

O escolhido para animar os bailes foi novamente o famoso sanfoneiro Fabrício, o garanhão da fronteira. Ele estava no Rio Grande do Sul, tocando numa festa, quando foi alcançado por um emissário de Anita Garibaldi. Prontamente, atendeu ao chamado de meu pai, mas, desta vez, não ficou hospedado em nossa casa, mas no pequeno hotel do lugar, pois a família estava toda envolvida com a festividade e não tinha como atendê-lo.

Fabrício animou os bailes durante os três dias. Eles tinham início na parte da tarde e entravam pela noite. Só que, no último dia dos festejos, na hora de acertar o pagamento, houve um complicador. Todos os pagamentos eram feitos pelo velho Granzotto, uma espécie de prefeito do lugar. Ele era um homem de poucas falas e bastante ranzinza. Ao lhe ser apresentada a conta do sanfoneiro, ele disse que não pagava, pois  achava  o preço  muito  alto. Meu pai que estava presente, ficou numa situação constrangedora, pois fora ele quem mandara chamar Fabrício, a pedido dos organizadores da festa. Tentou argumentar, mas o homem permaneceu inflexível.
– Só pago – disse ele – se houver um bom desconto.
– O meu preço é este – argumentou Fabrício. – É o que eu cobro em todos os lugares.
– Mas este preço eu não pago – concluiu o velho Granzotto.
Fabrício se retirou e resolveu não insistir, mas preparou uma revanche. Ele tinha ainda que tocar no baile de encerramento e resolveu fazê-lo para não decepcionar sua plateia. Subiu no estrado que ficava num plano elevado no salão e executou as melhores peças de seu repertório. A notícia do calote já correra entre os participantes da festa e todos estavam revoltados. Já no final do baile, Fabrício parou de tocar e, dirigindo-se ao público, falou:
– Antes de qualquer coisa, quero agradecer os aplausos e o entusiasmo de todos vocês. Agradeço a acolhida que tive do povo de Anita Garibaldi. Para encerrar essa festança de Santa Bárbara, compus uma modinha que dedico ao povo do lugar.
Soltou os primeiros sons de seu famoso acordeão e, com voz forte, cantou por seguidas vezes o seguinte:

Quando eu tava no Rio Grande
Me mandaram me chamar
Para Anita Garibaldi
Uma festa eu vim tocar
Depois de acabada a festa
Não quiseram me pagar
E não foi outra pessoa
Foi o chefe do lugar.

Assim, terminou, melancolicamente, a festa de Santa Bárbara. O bom senso das pessoas dizia que a atitude tomada pelo  chefão do lugar fora injusta e que  o sanfoneiro Fabrício não merecia aquele desaforo, mas a modinha dele ficou famosa e todos a divulgaram pelo povoado e cercanias.

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quinta-feira, 18 de setembro de 2014

D. JOÃO VI E SUAS ESQUISITICES


Simplício Rodrigues de Sá - Retrato de Dom João VI.jpg



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O livro 1808 de Laurentino Gomes (Editora Planeta) traz na capa o seguinte texto: “Como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão Bonaparte e mudaram a História de Portugal e do Brasil”. No capítulo 13, o autor fala especificamente do regente (depois rei) D. João VI e descreve  algumas de suas esquisitices. Aqui, reproduzimos algumas delas.

“ O Príncipe regente e, depois de 1816, rei do Brasil e de Portugal, D. João tinha medo de siris, caranguejos e trovoadas. Durante as frequentes tempestades tropicais do Rio de Janeiro, refugiava-se  em seus aposentos na companhia do roupeiro predileto, Matias Antônio Lobato. Ali, com uma vela acesa, ambos faziam orações a santa Bárbara e são Jerônimo até que cessassem os trovões. Certa noite foi picado por um carrapato na fazenda de Santa Cruz, onde passava o verão. O ferimento inflamou e causou febre. Os médicos lhe recomendaram banho de mar. Como temia ser atacado por crustáceos, mandou construir uma caixa de madeira, dentro da qual era mergulhado nas águas da Praia do Caju, nas proximidades do Palácio de São Cristóvão. A caixa era uma banheira portátil, com dois varões transversais e furo laterais por onde a água do mar podia entrar. O rei permanecia ali dentro por alguns minutos, com a caixa imersa e sustentada por escravos para que o iodo marinho ajudasse a cicatrizar as feridas.

Esses mergulhos improvisados na Praia do Caju, a conselho médico são a única notícia que se tem de um banho de D. João nos treze anos em que permaneceu no Brasil. Quase todos os historiadores o descrevem como um homem desleixado com a higiene pessoal e avesso ao banho. “Era muito sujo, vício de resto muito comum a toda a família, a toda a nação”, afirmou Oliveira Martins. “Nem ele, nem D. Carlota, apesar de se odiarem, discrepavam na regra de não se lavarem.” A relutância da corte portuguesa contrastava com os costumes da colônia brasileira, onde os cuidados com o asseio pessoal chamava a atenção de quase todos os viajantes que por aqui passaram nessa época.”Apesar de certos hábitos que aproximam da vida selvagem os brasileiros da classe baixa, qualquer que seja sua raça, é para notar que todos eles são notavelmente cuidadosos com a limpeza do corpo”, escreveu o inglês Henry Koster, que morou em Recife entre 1809 e 1820."

Entre outras excentricidades do monarca, o autor se refere ao seu gosto pelos famosos franguinhos, que costumava levar na  algibeira de seu surrado casaco. Já vinham desossados e assados na manteiga e ele os devorava com avidez, forçando, naturalmente, seu intestino a funcionar em momentos impróprios. Mas o rei não se incomodava com o fato, pois se prevenia, levando consigo uma cadeirinha com um grande penico em baixo. No momento oportuno, ele descia da carruagem, baixava os calções e ali, diante de todos, fazia suas necessidades, mesmo que mulheres estivessem presentes.

Esse era o rei D. João VI, mas o escritor Laurentino Gomes conclui, afirmando a importância dele para o Brasil, com a abertura dos portos e o consequente desenvolvimento da economia brasileira,
transformando uma colônia esquecida, num reino e, depois, num país independente com a proclamação da independência por seu filho, D. Pedro I. Nascia o império brasileiro.

Laurentino Gomes escreveu uma trilogia extraordinária sobre a história brasileira, com os livros: 1808, 1822 e 1889. É leitura imperdível. Você encontra os livros nas boas livrarias. Esses livros foram escritos numa linguagem fácil e agradável, fruto de uma pesquisa imensa. O leitor encontra nesses livros aquela história brasileira que não lhe contaram na escola.



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quarta-feira, 10 de setembro de 2014

SEMINÁRIO SANTO ANTÔNIO, O MAIOR SEMINÁRIO DO BRASIL


             Resultado de imagem para seminário Santo Antônio Agudos









Quando vejo a majestosa construção do Seminário Santo Antônio, situado no município de Agudos, São Paulo,minha memória volta ao passado, exatamente ao ano de 1949, quando fui o primeiro seminarista a pisar no local, onde estava sendo construída a primeira ala do seminário, para acolher os alunos que ali chegariam no ano de 1950. Esses alunos eram originários do Seminário São Luís de Tolosa, Rio Negro, Paraná, cujas instalações já não comportavam o grande número de seminaristas, além das condições difíceis de funcionamento da instituição. Em tempo: no antigo prédio do Seminário São Luís de Tolosa funcionam hoje a prefeitura e diversas secretarias da cidade de Rio Negro, além da preservação de um imenso parque eco turístico, deixado pelos franciscanos.

Explico, agora, porque fui o primeiro seminarista a chegar ao seminário Santo Antônio, em Agudos. Naquele ano de 1949, eu, juntamente com meu colega José Egídio, fomos passar as férias de final do ano na cidade de Itápolis. Ficamos alojados nas dependências da paróquia, cujo pároco era frei Edvino. Ele, então, me convidou para acompanhá-lo até Agudos, pois queria conhecer o local da construção do novo seminário. Essa, a razão de ter sido eu o primeiro seminarista a pisar no local, cujas obras eram feitas em regime de urgência urgentíssima, para receber no início de 1950 a primeira turma de seminaristas, vinda de Rio Negro. A eles, coube a tarefa de desbravar o local. Fui designado por Frei Tadeu, o padre prefeito, para chefiar uma turma que, munida de foices e enxadas, tinha por missão limpar os arredores da construção e demarcar a área do cemitério, onde estão hoje sepultados alguns de meus antigos mestres.

Nessa primeira leva de seminaristas, estava a figura sempre lembrada de Irany Fracasso, hoje frei Anselmo. Acompanhamos, a época, com doloroso pesar, todo o processo de cegueira que o atingiu, tornando-se ele o primeiro cego a ser ordenado sacerdote no Brasil e o segundo no mundo. O outro, era um alemão. Detalhes dessa história pode ser lida neste blog, sob o título: 50 Anos de Luz nas Trevas.

As instalações do Seminário Santo Antônio foram construídas em estilo colonial moderno e hoje abriga o convento dos frades e pode abrigar mais de 300 seminaristas. Recebe também eventos de diversas categorias, tendo, para tanto, uma verdadeira estrutura hoteleira. Destacam-se na construção, a capela do padroeiro, Santo Antônio, um grande auditório com capacidade para 388 lugares, biblioteca, pequeno museu, piscina olímpica, ampla área verde em torno das dependências do educandário. O seminário foi construído no terreno de uma pequena fazenda, cuja produção ajuda na manutenção do seminário.
Em tempo:  o seminário Santo Antônio, hoje não tem mais nenhum aluno. Virou um grande hotel para eventos de cunho religioso. Sinal dos tempos. 

Foi professor deste seminário, Frei Evaristo Arns, depois cardeal de São Paulo, cujas atividades ficaram notórias no período dos governos militares. Aqui também estudou o teólogo Leonardo Boff, hoje conhecido em todo o Brasil pelos numerosos livros que escreveu.

O Seminário Santo Antônio pertence à Província da Imaculada Conceição dos frades franciscanos, cujos conventos estão espalhados pelos estados do Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Além da catequese, eles se dedicam a numerosos projetos nas áreas de educação e assistência social. São donos também da mais antiga editora do pais, a Editora Vozes, situada na cidade de Petrópolis, Estado do Rio de Janeiro, fundada em 1901, sendo uma das maiores do Brasil.

Para maiores informações sobre o Seminário Santo Antônio:
Tel. (32) 3239-8600
E-mail: faleconosco@seminariosantoantoniojf.com.br

Assinado: Reinaldo Heitor Souza




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Para escrever o livro Operação Kaaba, o autor se inspirou nas profecias de São Malaquias que se refere ao último papa da Igreja Católica (Petrus Romanus), que sofre violenta perseguição, com Roma destruída. A narrativa se inicia com um navio das NAU (Nações Árabes Unidas) torpedeado por Israel, tendo mísseis enviados pelos árabes  contra o país judeu. Países ocidentais dão apoio a Israel e inicia-se a Guerra do Oriente Médio. O papa Pedro Paulo I é um brasileiro e foge para o Brasil, refugiando-se no Mosteiro dos Novos Templários, na Serra da Mantiqueira, em São Paulo. A NAU envia ao Brasil 4 terroristas para sequestrar o papa, pois querem usá-lo como moeda de troca para encerrar a guerra. Auxiliados por uma seita de fanáticos no Brasil e pelas Milícias de Alá, eles conseguem seu intento. Sequestram o papa e o levam para uma fazenda na fronteira do Paraguai. O governo brasileiro ataca a fazenda, tentando libertar o pontífice, mas os terroristas conseguem fugir com ele para um abrigo  no interior do Paraguai, de onde o enviam para a Arábia, para ser julgado. Nesse tumultuado julgamento, o pontífice será condenado ou absolvido? O livro tem um desfecho sensacional.

Para ler o livro, pagando uma taxa simbólica, acesse amazon.com.br

 


 

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terça-feira, 2 de setembro de 2014

HISTÓRIAS ESCANDALOSAS RELATADAS PELA BÍBLIA



A famosa sentença do Rei Salomão

A Bíblia Sagrada, mais especificamente o Antigo Testamento, traz alguns relatos bem escabrosos, vivenciados por alguns de seus mais ilustres protagonistas, como reis, patriarcas e homens que  falavam com Deus. Vamos, aqui, relatar alguns desses episódios.

O patriarca Abraão era casado com Sara, um mulher estéril. Ela  permitiu que o marido dormisse com Hagar, sua serva egípcia, que deu um filho ao patriarca, de nome Ismael. Mas Sara, nesse meio tempo também engravidou, gerando Isaac. A convivência entre as duas mulheres se tornou impossível e Hagar foi expulsa da família com seu filho Ismael e penou durante muito tempo no deserto. De  Ismal descendem os povos árabes e de Isaac, o povo judeu. Dessa desavença familiar, se originaram os conflitos que dividem os dois povos ao longo da história.

Ló era sobrinho de Abraão. Eles partilharam suas riquezas durante muito tempo, até o dia em que Ló achou melhor seguir seu próprio caminho, acabando por se estabelecer na cidade de Sodoma, onde imperava o pecado e a devassidão. O mesmo acontecia na cidade de Gomorra. Deus resolveu punir as duas cidades, mas Abraão intercedeu  pela vida do sobrinho. Então, Deus enviou a Sodoma dois anjos, jovens de extraordinária beleza. Ao chegarem à casa de Ló, os habitantes da cidade cercaram os jovens, para praticarem atos impuros, atos esses que passaram à história com o nome de sodomia. Ló se desesperou e falou ao povo: 
- Não façam isso, pelo amor de Deus. Para mim, a hospitalidade é sagrada. Mas se quiserem, podem levar minha duas filhas. Ela são virgens, jovens e bonitas...

Quando o poviléu se aproximou das jovens, os anjos reagiram e cegaram os intrusos. Depois, conduziram os membros da família de Ló a salvo, para fora da cidade, proibindo a todos que olhassem para trás, enquanto a cidade era consumida pelo fogo. Infelizmente, a mulher de Ló não conseguiu controlar a curiosidade, virando a famosa estátua de sal.

As Filhas de Ló, salvas daquele estupro coletivo, também não tiveram um comportamento exemplar. Pouco depois da saída de Sodoma, a família de Ló vagou por numerosos lugares. Uma noite, abrigados numa caverna (os anjos já tinham ido embora), Ló bebeu vinho além da conta e  se embriagou. As filhas, preocupadas com o futuro da famíla, resolveram proporcionar ao pai um novo descendente. Deitaram-se com ele, uma de cada vez, e tiveram relações sexuais com o progenitor. É a primeira narrativa de incesto que temos na história da humanidade.

O rei Davi  se apaixonou perdidamente por Betsabá, mulher de Urias, um general de seu exército. Davi mandou que trouxessem a bela mulher ao palácio e dormiu com ela, enquanto o marido traído, combatia os amonitas. Betsabá engravidou do piedoso rei e Davi se viu numa situação embaraçosa. Como encobrir do marido o seu ato pecaminoso? Ele encontrou uma engenhosa solução. Mandou chamar Urias do campo de batalha e ordenou que ele ficasse em casa  com a esposa. O rei pensou que seu general, por longo tempo longe do lar, iria dormir com Betsabá,  tornando-se, aparentemente,  o responsável pela sua gravidez, livrando a cara do piedoso monarca. Mas  o valente soldado se recusou a ter relações sexuais com a mulher, pois isso o  tornaria  fraco para o combate. Davi não desistiu. Quando a amante lhe relatou o  fato, tomou um decisão drástica. Ordenou que Urias retornasse imediatamente ao campo de batalha. Quando ele se encontrava na linha de frente, o rei mandou repentinamente a tropa recuar,  deixando o general a mercê de seus inimigos, que o trucidaram sem piedade.

O Rei Salomão, filho de Davi, ficou conhecido pela sua sabedoria, riqueza e capacidade administrativa, tendo construído o famoso templo de Jerusalém, que leva o seu nome. Ficou também conhecido pela sua sabedoria e senso de justiça, como no famoso episódio das duas mulheres que vieram reclamar a posse de uma criança, ambas afirmando serem a mãe do bebê. Salomão chamou um guarda e mandou dividir a criança em duas partes, uma para cada reclamante. A mãe verdadeira se desesperou, enquanto a outra ficou impassível. Salomão mandou entregar a criança à mulher que chorava.

Entretanto, a vida sexual do rei,  tinha alguns aspectos intrigantes, pois a Bíblia fala que ele tinha um harém com 700 esposas, além de 300 concubinas. Haja apetite!


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segunda-feira, 1 de setembro de 2014

COMO ERA A VIDA DIFÍCIL DOS CIGANOS NOS TEMPOS DE OUTRORA

                                                                                                            



Na minha adolescência, no Sul do Brasil, tive a oportunidade de conviver com numerosas caravanas de ciganos, que chegavam ao povoado, onde morávamos. Tais caravanas eram formadas por gente rude e sofredora, cujos costumes contrastavam com o modo de vida das pessoas do lugar. A seguir, publico uma parte do capítulo 13 do meu livro Menino Tropeiro, com uma descrição minuciosa desses acontecimentos. 

"No inverno de 1941 chegou ao povoado uma grande caravana de ciganos. Eles vinham do Sul, mais precisamente do Uruguai. Vinham a cavalo e traziam seus utensílios em carretas. Falavam espanhol e um pouco de português. Armaram suas tendas junto à estrada estadual, a 500 metros da pequena igreja de Santa Bárbara. A presença deles causou certo temor à população, pois a má fama os precedia. Falava-se em rapto de crianças, em negócios nebulosos com cavalos, roubos e outras coisas mais.
As ciganas, com suas saias rodadas, se espalharam pelas casas, oferecendo-se para ler a sorte das pessoas. Uma delas esteve em nossa casa e manteve uma longa conversa com minha mãe. Só que, depois que ela saiu, d. Lina deu pela falta de um queijo que estava numa prateleira na cozinha, fato que a deixou muito revoltada, pois tratara a cigana com todo o carinho e até lhe dera café e pão com manteiga.
– Veja, Heitor – disse ela para meu pai. – Tratei tão bem a safada da cigana e ela levou o queijo escondido naquele monte de saias. Deve ser para isso que usam tanta roupa.
– Eu te alertei. É um pessoal perigoso. Fazem negócios com cavalos: compram, vendem, trocam, trapaceiam. O pessoal conta por aí que eles trocaram uns matungos por uns belos cavalos de um caboclo lá perto de São Pedro. Só que, na primeira chuva, os cavalos mudaram de cor e uma tinta começou a escorrer de seus pelos.
–  Como, uma tinta?
– Dizem que pintam os cavalos para parecerem  novos  e viçosos. São  cavalos  velhos e imprestáveis e a maioria morre envenenada pelas tintas.
– E essa história que roubam crianças?
– Isso me parece invenção. Contam uma história que teria acontecido no Rio Grande do Sul, onde uma criança desapareceu, mas nada se confirmou.
Os ciganos ficaram algumas semanas em Anita Garibaldi e foi um alívio quando levantaram acampamento e seguiram seu caminho, mas conseguiram quebrar a monotonia do lugar. As mulheres  se vestiam com roupas  coloridas e, à noite,  à  volta do  fogo, eles dançavam suas danças típicas ao som de instrumentos musicais exóticos.
Aqueles homens e mulheres queimados de sol, com olhos sempre bem acesos e brilhantes e um sorriso nos lábios, falando uma língua estranha, despertavam a minha imaginação infantil. Ninguém sabia ao certo de onde vieram e nem que rumo iriam tomar. Suas crianças nos fitavam com curiosidade, eram maltrapilhas e tinham aparência doentia. Acho que passavam fome e frio, além de não frequentarem a escola. Embora a vida na minha família fosse difícil, nunca passamos fome e sempre tivemos um leito quente e limpo para dormir. A vida daqueles pequenos ciganos nos mostrava uma outra realidade que desconhecíamos.
Tempos depois, chegou a Anita Garibaldi outro bando de ciganos. Só que esses vieram em três caminhões e armaram três grandes barracões de lona num gramado, perto da casa de dr. De Negri. Eram exímios artesãos e viviam da fabricação de tachos e outros artefatos de cobre. As mulheres se vestiam ricamente, com muitos adornos de ouro e prata e diziam que algumas, além de vender “la suerte”, vendiam também seus lindos corpos, o que deixou muito homem alvoroçado e muita mulher vigilante no pequeno povoado.
Quando o chefe do clã fez aniversário, os ciganos prepararam uma grande festa para ele e convidaram as pessoas mais importantes do lugar e dos povoados vizinhos por onde já tinham passado. Meu pai foi um desses convidados e ficou admirado com a grandiosidade da festa. Decoraram os barracões com lindas colchas bordadas a ouro e a baixela em que foram servidas as  iguarias  era  formada  por peças de ouro e prata, além de fina porcelana. O banquete tinha carneiro assado, além de outras carnes, sem falar do vinho servido aos numerosos convidados, de qualidade excepcional. O próprio dr. De  Negri  que  participara de mesas requintadas nas mansões de seus parentes na Itália, ficou admirado com a ostentação demonstrada pelos ciganos. Os convidados ainda foram brindados com danças e músicas típicas. Quando a festa terminou, já era dia claro."
   

                 

terça-feira, 15 de julho de 2014

MARTIM CERERÊ, JOGADOR DE FUTEBOL







Cassiano  Ricardo (1895-1974), é o autor de  Martim Cererê, Jogador de Futebol. Cassiano Ricardo é um nome consagrado da moderna literatura brasileira.

MARTIM CERERÊ, JOGADOR DE FUTEBOL


O pequenino vagabundo joga bola
e sai correndo atrás da bola que salta e rola.
Já quebrou quase todas as vidraças,

Inclusive a vidraça azul daquela casa
onde o sol parecia um arco-íris em brasa.
Os postes estão hirtos de tanto medo.
(O pequenino vagabundo não é brinquedo...)

E quando o pequenino vagabundo
cheio de sol, passa correndo entre os garotos,
de blusa verde-amarela e sapatos rotos,
aparece de pronto um guarda policial,
o homem mais barrigudo deste mundo,
com os seus botões feitos de ouro convencional,
e zás! carrega-lhe a bola!
“Estes marotos
precisam de escola..."

O pequenino vagabundo guarda nos olhos,
durante a noite toda, a figura hedionda
do guarda metido na enorme farda
com aquele casaco comprido todo chovido
de botões amarelos.
E na sua inocência improvisa os mais lindos castelos;
e vê, pela vidraça,
a lua redonda que passa, imensa,
como uma bola jogada no céu.
“É aquele Deus, com certeza,
de que a vovó tanto fala.
Aquele Deus, amigo das crianças,
que tem uma bola branca cor de opala
e tem outra bola vermelha cor do sol;
que está jogando noite e dia futebol
e que chutou a lua agora mesmo
por trás do muro e, de manhã, por trás do morro,
chuta o sol.


                                           

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quinta-feira, 6 de março de 2014

A "BELLE ÉPOQUE" AMAZÔNICA CHEGA AO FIM. É O "CRACH" DA BORRACHA





                                                    Teatro Amazonas - restaurado


"Sobre o palco onde ontem soaram vozes do Scala de Milão e dançaram os leves pés de Pavlova, caíra uma camada de poeira. O cupim devorou as vigas de madeira que sustentavam a abóboda de azulejo, e o candelabro de cristal espatifou-se no chão." 
(David Saint Clair, historiador americano.)

As grandes noites do Teatro Amazonas chegavam ao fim. Os seringais cultivados na Malásia e Cingapura, superavam a produção nacional de borracha, que, em 1913, correspondia a 67% da asiática, e no ano seguinte caia para 44%. Pior ainda, o custo de produção na Ásia era inferior ao da Amazônia, onde as técnicas eram primitivas, o transporte oneroso e muito pequeno o rendimento do trabalho em árvores dispersas e de difícil acesso. "Enquanto um trabalhador da Malásia podia recolher num só dia três quilos de borracha, um serigueiro do Amazonas recolhia um só quilo, de 8 a 15 dias". (Prado e Capelatto.)

 Manaus despediu-se do antigo esplendor no carnaval de 1915. A festa começara animada, com toda a população dançando e brincando nas ruas, clubes e cafés. A alegria chegou ao auge quando, no corso da avenida Eduardo Ribeiro,  desfilaram os "Paladinos da Galhofa", em onze carros alegóricos. Em um deles ia Ária Ramos, a musa dos "Paladinos", considerada a moça mais bonita da cidade. À noite, no Clube Ideal, houve um baile. Num intervalo da orquestra, pediram a Ária que tocasse no violino a valsa Sublime Amor. Quando terminou a execução, explodiram os aplausos. Ária soltou um breve gemido, levou a mão direita ao pescoço e caiu. Um bando de mascarados, palhaços, piratas, pierrôs correu até o palco e debruçou-se sobre a jovem. Lá atrás, um moço fantasiado de cowboy, segurava o revólver e balbuciava:"Foi um acidente." 

No mesmo ano, o preço da borracha caiu verticalmente. Em 1916, já não houve carnaval. A atmosfera de decadência corroeu o luxo das mansões em Manaus e Belém, a outra capital da borracha. As duas cidades começaram a entrar num marasmo, típico dos centros urbanos que viveram um luxo artificial.

"A memória prefere o apocalipse. Numa manhã calorenta de Manaus, os quadros da ruína: suicídios, debandada de aventureiros, navios lotados de arrivistas em fuga, as passagens esgotadas, famílias inteiras em mudança, os palacetes abandonados. Os que permaneceram ou não tiveram força para escapar, foram contaminados pelos sintomas da miséria crescente (...), como o mato [que] assaltava as ruas calçadas com paralelepípedos importados". (Márcio de Souza, escritor.)

Texto extraído da coleção Nosso Século da Abril Cultural, copyright 1980.

 


                                           

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