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Gilda, no vigor de seus 20 anos. Ela morreu com 80. Para nós, que a conhecemos, valem aquelas palavras do filme: "Nunca houve uma mulher como Gilda". |
Gilda, uma esposa dedicada, uma mãe amorosa, uma avó especial, mulher de muitos... muitos amigos. A doença a levou, mas ficamos com a lembrança de sua personalidade marcante, de seu temperamento dinâmico, de seu coração generoso. A seguir, um texto em que ela mesma se revela.
"Gilda é o meu nome! É de origem teuto
germânica, quer dizer valorosa e foi escolhido pelo meu pai. Na Europa
pronuncia-se Guilda e na França também é nome masculino. Minha mãe, gostaria de
ter me chamado de Leonor mas sinceramente, prefiro o meu nome. Apesar de achar
Leonor muito bonito e delicado gosto mais de Gilda por ser menos comum e de
bonita grafia. Leonor me lembra uma jóia antiga e muito delicada com pedras
verdes. Gilda tem mais a minha cara.
Nasci em abril, portanto sou ariana um sério
problema, pois sou teimosa, explosiva, arrebatada, passional, (agora nem tanto,
pois já sou uma mulher madura, mas isso quer dizer apenas que fiquei mais
esperta e mais velha também), sou muito apegada a detalhes acho até que exagero,
cobrando mais do que devia de mim mesma. Sou muito crítica em relação a minha
pessoa.
Sou impulsiva, rebelde, contestadora, ansiosa
como só eu mesma. Sou apaixonada pela vida, pela natureza, pelas pessoas. Meu
marido costuma dizer que eu me acho. Mas, aquilo que sou realmente capaz de
fazer bem feito aí, eu me acho mesmo, não somente por orgulho ou vaidade mas
pelo prazer de saber fazer com esmero, capricho, com cuidado. Amorosamente. Meu
Deus! Como sou vaidosa! Acho que tenho senso de justiça aguçado mas sou apenas
um ser humano passível de erros. Aliás sou cheia de defeitos mas também tenho
algumas raras qualidades.
Sou amiga das pessoas, ajudo no que me for possível,
sou amorosa, extremamente romântica, receptiva, não guardo rancores. Enfim, sou
de Áries!
Meus pais foram: Mario, um belo tipo brasileiro. Alto, moreno, esguio
e Maria da Piedade uma bonita portuguesinha, baixinha, de cabelos louros e olhos muito
azuis que,quando nova era chamada de russa por ser tão loura. Tive apenas um
irmão de nome Mario, de quem gosto muito.
Aos dezoito anos casei-me com meu
querido amor, Reinaldo, que tinha à época 27 anos. Isso aconteceu há quase
quarenta e oito anos. Reinaldo é filho de Aristotelina Gomes de Sousa e Heitor
Sousa, naturais do estado de Santa Catarina no sul do Brasil. Tivemos cinco
filhos que nos proporcionaram até o presente momento cinco netos. Por ordem de
nascimento são eles: Pedro Henrique de 21 anos, Nina e João Felipe
de 19, Fernanda de 17 e o mais novo de todos Ricardo Augusto de 10 anos.* Três
filhos nossos moram aqui no Rio, os outros dois moram uma em São Paulo e outro em
Santana do Livramento.
Pedro
e Nina são morenos e de biotipo bem magro. João, Fernanda e Ricardo são bem
claros lembrando tipos europeus. Todos são extremamente bonitos, inteligentes e
saudáveis nessa mistura maravilhosa de raças que cambiam em nosso país.
Realmente, abaixo da linha do Equador tudo é diferente. Somos mais ardentes,
passionais, apaixonados e apaixonantes. Somos assim!
Parece
que o verão chegou afinal para nosso tormento. Tanta bobagem escrita apenas
para treinar o teclado do computador. Aos poucos vou me acostumando novamente
com a posição dos dedos sobre o mesmo. Afinal,eu possuía um diploma (como era
chamado nos anos cinquenta) de datilografia. Media quase um metro, um horror!
Estou mesmo enferrujada mas vou conseguir. Hei de vencer! Por hoje é só, pois estou um pouco tonta, mas
a posição dos dedos já está se tornando mais fácil. Ontem dia 13 de setembro se
completaram 48 anos da morte do meu pai, algo tão distante. Nós éramos muito próximos, gostávamos de sair
juntos. Meu pai era tão novo. Quando faleceu tinha apenas 48 anos e eu 18. Ele
sentia imenso prazer em apresentar-me às pessoas suas conhecidas. Quando eu
tinha 14, 15 anos ele sempre me acompanhava à escola e além de ser, possuía uma
aparência tão jovem que as outras alunas achavam que ele era meu namorado. Meu
pai morreu muito novo. Não tivemos tempo de nos conhecermos melhor. Ele não pôde
ser meu pai por mais tempo.
Hoje
já estou um pouco mais ambientada com o teclado mas nem de leve posso imaginar
que algum dia conseguirei bater algum texto sem que não possa olhá-lo. Preciso
aprender a fazer isso o mais rápido possível, pois o tempo urge, passamos por
ele muito depressa. Enquanto espero a hora da novela vou me habituando a digitar,
vagarosamente. Quero aprender a passar e-mails para todos. Não quero ser uma
pessoa que ficou parada no tempo apenas olhando e limpando a poeira dessa máquina de
fazer loucos. Quero ser uma também! Apesar de achar que o computador ainda é
uma trapizonga muito cheia de fios, estou começando a gostar da brincadeira,
pois assim sinto-me um pouco inserida nesse mundo da informática coisa que
jamais pensei que veria.
Hoje é sexta-feira e faz três dias que comecei esta
tarefa insana de querer aprender a digitar. Só mesmo sendo louca! Mas, apesar de
tudo vou indo bem.Comecei a usar os sinais que pareciam
um grande mistério mas na verdade não são. Agora, vou assistir à novela. Amanhã
tem mais."
*Quando ela faleceu, já tinha dois bisnetos: Gael, filho de Fernanda e Lohan, filho de Pedro Henrique.
O mãezona, amiga, incentivadora, guerreira, brigona, colo, sorriso, força, amor, carinho. São tantas coisas que a senhora foi e sempre será em nossa vida que não cabe em palavras todo o privilégio de ter sido um dos passarinhos do seu grande ninho. Passarinho emprestado, nesse grande e generoso ninho. Vou lutar aqui para não deixar a tristeza me invadir, eu sei que a senhora não gostaria e diria com sua voz doce e firme, cara levanta a cabeça, acalma esse coração, estou bem, a vida é uma benção. Fica comigo o imenso carinho, o abraço que era conforto e esse gigantesco amor por todos nós. Mãezinha segue a viagem e que na imensa generosidade divina nos encontraremos para as mais deliciosas risadas. O peito aperta e a responsabilidade aumenta de ser digno do amor que recebi da senhora dona Gilda.